Guedert Advogados

O pagamento com cartão na modalidade crédito é considerado pagamento à vista?

 

É muito comum no comércio a concessão de desconto para os clientes que efetuam pagamento em dinheiro, sendo negado tal benefício àqueles que pagam com cartão de débito, no crédito à vista ou de modo parcelado, sob alegação de que há cobrança de taxas provenientes destas modalidades. Mas só recentemente, após muita polêmica e algumas discussões na Justiça, foi criada uma lei que regulamenta cobranças diferentes para cada forma de pagamento.

Desde 27 de dezembro de 2016, quando entrou em vigor a Medida Provisória (MP) 764/2016, seguida pela Lei 13.455/2017, os comerciantes podem oferecer descontos a quem compra à vista ou em dinheiro sem sofrer penalizações dos órgãos de defesa do consumidor.

A mudança na legislação facilita a negociação com o cliente e permite que os comerciantes ofereçam preços mais competitivos, especialmente para compras em dinheiro. A alteração também pressiona as administradoras de cartões de crédito a diminuir as taxas de administração cobradas dos estabelecimentos comerciais.

Tal negociação por melhores preços pode ser eficiente no país, já que uma pesquisa realizada em conjunto pela SPC Brasil e pela Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) apontou que 77% dos brasileiros costumam pedir descontos.

O que diz a nova lei?

Em vigor desde o dia 27 de junho de 2017, quando foi publicada, a Lei 13.455, promulgada um dia antes, diz em seu texto que “fica autorizada a diferenciação de preços de bens e serviços oferecidos ao público em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado”.

Isso pode ser mitigado em contratos?

Uma disposição contratual não pode impedir o direito do lojista de fazer a diferenciação de preços de acordo com a forma de pagamento. Para reforçar o entendimento da legalidade da prática de cobranças distintas, o texto da nova lei realça ser nula qualquer cláusula em contrato, estabelecida em arranjos de pagamentos ou outros acordos de prestação de serviço de pagamento, que proíba ou que restrinja as opções de diferenciação dos preços.

Qual a obrigação do vendedor?

A nova lei permite a cobrança diferenciada, mas também estabelece uma obrigação ao lojista. Foi acrescentado um artigo à Lei 10.962/2004 para destacar que “o fornecedor deve informar, em local e formato visíveis ao consumidor, eventuais descontos oferecidos em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado”.

Significa dizer então que, para cobrar um valor diferente do comprador em caso de uso de cartão de crédito, o lojista tem que garantir que o consumidor saiba disso antes de efetuar a compra. Se isso não for feito, o vendedor estará sujeito a sanções previstas na Lei 8.078/1990, conhecida como Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Sempre foi permitida a cobrança diferente no crédito à vista?

A nova lei que disciplina a cobrança com preços diferenciados é uma mudança importante na visão que se tinha até então sobre o assunto, inclusive nos tribunais. Principalmente pelo fato de que ela vai contra uma decisão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Recurso Especial 1.479.039-MG que, em 2015, rejeitou um pedido que tentava impedir o Procon de Minas Gerais de aplicar penalidades a empresas pela cobrança diferenciada.

Na ocasião, a maioria dos ministros do STJ considerou que dar descontos para pagamentos em determinada modalidade era uma prática abusiva, especialmente porque o pagamento no crédito à vista é equivalente ao pagamento em dinheiro. Na avaliação dos membros da 2ª Turma da Corte, após autorizada a operação, o encargo está adimplido, ou seja, é dada uma quitação, que extingue a obrigação de pagar.

Para fundamentar a decisão que, na época, manteve a permissão ao Procon de penalizar empresas por cobranças diferenciadas, o Superior Tribunal de Justiça baseou-se no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e na lei que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, que visam, entre outras considerações, proteger as práticas abusivas no comércio de bens e serviços.

Até a vigência da MP e, consequentemente, da Lei 13.455/2017, somente em caso de pagamento parcelado no cartão de crédito era possível que o fornecedor cobrasse mais caro do que se o pagamento fosse realizado à vista, pois neste caso, o consumidor estaria contratando um crédito/empréstimo/adiantamento, sendo tolerado que lhe fossem repassados os juros do parcelamento, desde que o comprador fosse avisado.

O lojista é obrigado a aceitar cartões ou cheques?

De qualquer forma, o que não mudou mesmo com a nova lei sobre o assunto é que os estabelecimentos comerciais não são obrigados a aceitar outra forma de pagamento além de dinheiro em espécie. A aceitação de cheque, dos cartões de débito ou de crédito ou outras modalidades para pagamento, por exemplo, segue sendo apenas uma opção do comerciante.

Os preços diferenciados passam a ser obrigatórios?

Com a nova lei, os lojistas também não passam a ser obrigados a praticar diferentes preços para cada forma de pagamento utilizada pelo cliente. A mudança na legislação tem como objetivo protegê-los caso considerem a prática necessária, mas cada lojista tem o direito de adotar os preços conforme avaliar mais conveniente. Se preferir manter os mesmos preços independentemente da forma de pagamento, o lojista poderá fazê-lo sem problemas.

A mudança na lei gerou consenso?

A alteração trazida pela MP de 2016 e pela lei de 2017 continua rendendo debates, sobretudo por conta da pressão das entidades civis que atuam na área no país. Grupos como a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) continuam considerando a cobrança abusiva e, por isso, defendem a regra antigamente definida pelo STJ. A avaliação da Proteste é que a adesão ao cartão de crédito já gera ao consumidor um gasto extra, como a anuidade. Além disso, haveria custos com outras tarifas e pagamento de juros caso seja necessário acessar o crédito rotativo, por exemplo.

Entidades que defendem os comerciantes, como a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), sempre defenderam a alteração na lei.

Durante as audiências públicas que embasaram o texto da MP aprovada no ano passado, Bruno Breithaupt, diretor da entidade, apontou que, com a vedação dos preços diferentes, os custos operacionais repassados pelas administradoras de cartões era diluído nos preços dos produtos, gerando no consumidor uma falsa sensação de que a opção por pagar por meio do cartão de crédito tinha um custo zero.

Na verdade, segundo a CNC, os valores distribuídos a mais nos preços dos produtos chegavam a 4,5% do valor da operação.

Mesmo gerando polêmica entre entidades de defesa do consumidor e associações de classe do comércio, a nova legislação que permite cobranças diferenciadas para compras no crédito à vista é uma realidade, e o lojista deve saber bem como aproveitá-la para garantir mais vendas, lucros e crescimento para a empresa.
E você, o que acha da possibilidade de cobrança diferenciada para as compras feitas no cartão de crédito à vista? Deixe sua opinião comentando no post.